As redes anti-sociais
As redes sociais tornaram-se uma presença diária nas nossas vidas e o que vemos por lá consome tempo, mói o juízo e espoleta a vontade extraordinária de discutir com estranhos que não concordam connosco em qualquer tipo de assuntos. Perde-se o filtro e não se escolhem as batalhas certas. Alguém conhece quem tenha mudado de opinião depois de ter sido insultado numa discussão do Facebook? As pessoas que nos são mais queridas também estão lá, desde parceiros e primos a pais e tios. Só com um desvio do alinhamento astral e uma série de buracos negros a dar o berro é possível que todas estas pessoas comunguem das mesmas opiniões e visões do mundo. Resulta daí que posições anteriormente reservadas para conversas de café depois de um almoço de família, aí umas três vezes por ano, sejam escarrapachadas em toda a sua glória nos feeds mal curados do Facebook. E isso só pode dar asneira. Aquela foto do pai bêbedo que nem um cacho vai cair mal ao filho, aquele post do primo sobre as mulheres estarem bem é na cozinha vai cair mal à tia, haverá troca de mensagens com screenshots envolvidos e as chamadas telefónicas começarão mais vezes com algo do género: Viste o que o teu cunhado pôs no Facebook? Que imbecil. Uma sociedade em que todos pensam da mesma maneira não é livre. Nas famílias onde ninguém discorda de ninguém, alguém exerce poder desequilibrado. É normal que tendamos a rodear-nos de gente com uma visão próxima da nossa, mas é bom aprender a lidar com quem está do outro lado, sem pensar nessa divisão como uma barricada mas como outra forma válida de ver o mundo. A comunicação digital representa uma oportunidade de criar pontes sobre as separações da vida moderna, entre diferentes cidades ou países. No entanto, a comunicação digital não substitui a comunicação ao vivo pelo menos nem sempre e não completamente. A comunicação digital é menos rica em termos dos canais sensoriais estimulados, resultando numa qualidade sensorial reduzida, comentou a propósito a psicóloga Astrid Carolus, da Universidade de Würzburg. A especialista em média também sublinhou o tal problema da hiperinterpretação. Em determinadas circunstâncias, as pessoas consideram a comunicação online como super pessoal e, assim, podem confundir e interpretar incorretamente as mensagens nas redes sociais. Simplesmente desactivar a conta torna-se cada vez menos viável. É preciso aprender a navegar nesta nova dimensão dos relacionamentos. E lembrar-nos que a próxima geração já não saberá o que era o mundo sem perfis nas redes sociais.
Inês Calvinho, nº57922
Inês Calvinho, nº57922