Muitas vezes se ouve dizer que não há vida como a de estudante e que estes devem aproveitar ao máximo essa vida antes de enveredarem no mercado de trabalho, antes de se tornarem adultos ativos e tomarem as rédeas de todas as preocupações e desafios inerentes. Mas, será que os estudantes, não terão também direito às suas dúvidas, inquietações e dificuldades? Claro que sim! Se não vejamos.
O nosso sistema de ensino inicia-se desde tenra idade, aos 5 anos, com a frequência do pré-escolar e aos 6 o início da escolaridade obrigatória, agora decretada até ao 12.º ano de escolaridade ou até que o aluno atinja a maioridade.
Aos 6 anos, as horas que a criança passa na escola são demasiadas, sendo que se trata sobretudo de tarefas de aprendizagem que exigem concentração e atenção e, muitas vezes, sentados na cadeira dentro da sala de aula. São deixados na escola antes das 9.00H e saem por volta 17.30H, algumas vezes ainda com trabalhos para fazer em casa. E o tempo de brincar, de ser criança, de estar com a família? Não estamos a programar máquinas, estamos a ensinar e educar crianças para o futuro, mas não deixando de ser crianças.
Chegam ao 2º ciclo com cerca de 10 anos e logo aí deparam-se com outra angústia. Deixam de ter apenas um professor que os conhecia bem, sabia cada nome, preocupava-se com todos para além de lhes ensinar e onde sentiam haver uma estreita relação entre a escola e a família. Agora passam a ter sete a oito professores que, a maioria, estão lá apenas para debitar as matérias, chegando ao final do ano sem sequer associar o rosto ao nome. Nesta fase, deixam de existir os trabalhos relativos às festividades: Natal, Carnaval, Dia do Pai, Páscoa, Dia da Mãe, entre outros. Só interessam os trabalhos propostos e as fichas de avaliação de acordo com os conteúdos leccionados ou a leccionar.
Aos 12 anos, outra decisão a tomar, mais uma língua estrangeira e passar de 5 disciplinas de estudo intensivo, para 8, uns horários extensos com manhãs e tardes ocupadas com aulas, restando, muitas vezes, apenas a quarta-feira à tarde livre, como estipulado, para a possibilidade da prática dos diversos desportos escolares promovidos em cada escola. E tempo para ler um livro, para ver o tal filme que tanto se esperou que estivesse em cartaz, para dar um passeio com amigos ou simplesmente para ouvir música ou descansar? Não há.
Eis que chega mais um dilema: a entrada no secundário e que área escolher, já que as opções para prosseguimento de estudos são tão redutoras e afuniladas. Será que é a idade certa, cerca de 15 anos, para tomar uma decisão tão importante para o nosso futuro, teremos maturidade, discernimento e conhecimentos suficientes acerca do mundo do trabalho e de nós próprios? Nem todos.
Somos realmente livres nessa escolha ou apenas dispomos de livre-arbítrio para optar de entre as opções apresentadas? Por isso, vemos tantos alunos a mudar de área, outros a decidir que curso universitário pretendem seguir quando se encontram a frequentar o 12.º ano.
Não seria mais benéfico que as áreas fossem mais divergentes, mais abrangentes e fossem afunilando ao longo do percurso escolar, aos poucos, de ano para ano, em vez de terem de seguir durante 3 anos algo que escolheram sem qualquer tipo de verdadeira certeza, sem uma correta orientação e exploração de todas as hipóteses possíveis?
Chegamos a outra etapa. Esta não só dolorosa para os estudantes como também para a família. A entrada na universidade. A rutura do ninho familiar, já que, por vezes, é coincidente com a deslocação do estudante para outra morada mais próxima do local de estudo, mudando até de concelho ou distrito. Nessa altura têm de conjugar o estudo com as tarefas domésticas. Aqui chegados são apenas um número, uma cara, tratados de forma indiferente, muito formal e nada empática. O professor apresenta-se de forma estou aqui para ensinar e não para ser vosso amigo. Seguem-se um sem fim de páginas para ler até queimar a pestana, de tantos trabalhos, apresentações, frequências. Intuito? Avaliar se a matéria dada foi percebida. Mas, um dos objetivos da universidade não deveria ser também preparar os jovens para o mercado de trabalho, sendo um elo de ligação entre o meio escolar e as empresas ou entidades empregadoras? Não são esses jovens estudantes os futuros trabalhadores? É verdade, mas não se faz. Ficam entregues a si próprios, à sua sorte, ao seu espírito de aventura, à sua iniciativa e perspicácia, já que o Coordenador/Diretor do curso não faz essa ponte, nem tão pouco fala individualmente com cada aluno do curso que dirige, nem que fosse uma vez por semestre, para ouvir as suas opiniões, dúvidas, barreiras e facilitadores e ajudá-lo, orientá-lo quer nas disciplinas opcionais a escolher de acordo com as suas pretensões, quer no estágio ou Mestrado a seguir, qual e onde.
Depois dizemos que há muitos adultos formados que não exercem o seu curso. Uns, certamente por falta de oportunidades, mas outros porque não gostam nem se vêem a fazer uma coisa que levaram anos a estudar, enquanto que quem os devia orientar e ajudar, apenas debita a matéria e descansa num gabinete com o seu nome gravado na porta.
Assim é a nossa educação.
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