Enquanto escrevo este texto (e há tanto que ando para o escrever!) revejo a palestra de Susan Cain sobre os introvertidos, que incide sobre as implicações que ter uma personalidade desse tipo tem na vida dessas pessoas, desde a interação com outros seres humanos às dinâmicas de trabalho. Convinha que, antes sequer de considerarem o que vos proponho, me seguissem nesse exercício, que pelo menos vos porá a questionar alguns preconceitos. Para o efeito, podem clicar neste link. Para ser sincero, esta espécie de dissertação sobre o tema valerá por si caso apenas a percecionem dessa forma: como uma singela apreciação sobre alguns dos preconceitos que aceitamos quando consideramos os trabalhos de grupo. Valerá sequer a pena problematizá-los e pesar os seus prós e contras?
Ponto de situação/declaração de interesses. A maioria das pessoas que vão ler este texto estão habituadas a fazer trabalhos de grupo, a cooperar, de facto, conhecem as vantagens em trabalhar - e, mais importante, pensar - coletivamente. Também em maioria estarão aqueles que têm doze anos de projetos de grupo (por ventura alguns, como eu, estarão com catorze). Numa questão lateral mas que para o caso se reveste de suma importância está o facto de eu, ao contrário de Susan Cain e de uma falange das pessoas que se revêm na sua palestra, não ser introvertido. Sou, por outro lado, um extrovertido seletivo, capaz de por metade de uma turma a rir e, ao mesmo tempo, permanecer na minha "quietude autista" por longos períodos de tempo caso assim o queira, leia-se, caso não me interesse interagir com quem me rodeia (ainda assim é pouco comum). E essa é, também, a minha declaração de interesses, pois não estou a encostar-me à teoria de Susan Cain para tentar levar a minha avante, antes considero que ouvi-la e entendê-la pode colocar o leitor num mindset necessário para a compreensão dos trabalhos de grupo e, quer-me parecer, aceitar o facto de, de ora em diante, eu não mais querer fazer parte deles (ou antes, tomar posição para que não os tenha de realizar).
Parece-me importante considerar os trabalhos de grupo quanto mais não seja porque, como já referi, são presença constante nas nossas vidas académicas - e, por extensão, nalgumas profissões - e os temos como um dado adquirido. E se tal está em consideração, importa também conhecer-lhes as vantagens: promovem a cooperação, fomentam laços de união ao mesmo tempo que se partilham responsabilidades, e criam empatia funcional (colocam-nos no lugar do outro, ajudam-nos a focalizar um objetivo comum e correr atrás dele). São, sobretudo, referentes da "equipa", do "coletivo", da existência de um comportamento/linha orientadora que move um grupo de indivíduos. É lógico que estas são boas noções (pelo simples facto de sermos seres sociais - não na medida em que temos de ter muitos amigos e ser divertidos mas sim pela ideia de que sem o "outro" nós não sobrevivemos), mas será que, volvido todo este tempo de formação, não estamos já tão mecanizados nestes princípios que a) não os levamos tão a sério quanto devíamos ou b) já são intrínsecos, já agimos instintivamente segundo eles? Ora segundo a minha experiência, as conclusões a que chego é que nem todos possuem estes referentes coletivos e nem aqueles que os têm abordam sempre os projetos coletivos com a empatia funcional com que deveriam. A juntar à equação estão os catorze anos de experiência que pelo menos os meus colegas têm de trabalhos de grupo. Já todos conhecem os princípios, já todos sabem que devem ser capazes de definir tarefas parcelares e cumpri-las (por forma a que o objetivo maior seja cumprido), já todos estão avisados que a partilha que se cria num trabalho de grupo implica, caso o seu trabalho individual não seja bem realizado, uma menor qualidade do produto final de todos. Se tal não se cumpre embora todos pelo menos tenham conhecimento do explicado acima, porque é que continuamos a insistir nos trabalhos de grupo?
As ideias que movem esta minha objeção são sobretudo do foro pessoal. Sinto que, passado todo este tempo, me devem um tempo a sós. Devem-me um alívio da pressão que está subjacente a trabalhar em equipa. Confesso que, passados todos estes anos, sinto necessidade de experimentar algo diferente, exceder-me, perceber quais os recursos e ferramentas a que recorrerei no caso de ter que fazer apenas projetos a solo. Antes sequer de pôr em causa o suposto acrescento de dificuldade deste exercício, acho necessário ponderar a sua exequibilidade. Já se perguntaram com objetividade porque é que fazem trabalhos de grupo e não individuais? Imagino que, além dos fundamentos que já referi e que servem como base aos trabalhos de grupo, se lembrem de outras vantagens, como poder fazer trabalhos maiores em menos tempo, poder dividir as tarefas dos vossos projetos segundo as áreas em que os elementos do grupo são mais fortes e, num âmbito mais pessoal, poder estar com pessoas do vosso interesse, aquelas com as quais já construíram laços de amizade e por isso se sentem mais à vontade para trabalhar. Mas quando nos despimos das ideias feitas e nos pomos da perspetiva do professor, acho que deste lote extraímos uma grande razão que leva à escolha de trabalhos de grupo: corrigir menos trabalhos (às vezes por escassez de tempo, outras vezes por mero aproveitamento) mas mais desenvolvidos, à medida em que se alargam as tais competências. Sobre isto há duas questões prementes. Primeiro, não será que permitir a escolha dos mesmos grupos sempre subverte a lógica dos trabalhos de grupo? Quantos de nós escolhe quase sempre trabalhar com as mesmas pessoas? E, pensando um pouco mais à frente, será que a falta de tempo pode ser escolho suficiente para que cada um seja impedido de entregar e até apresentar o seu trabalho individual? É porque isso, creio, seria resolvido com algum planeamento: bastava que entre aluno e professor se estabelecesse um tema possível de ser analisado dentro de um limite de páginas/palavras e que com isso se apelasse à capacidade de síntese. Se por um lado deixávamos de trabalhar em grupo e quem não o sabe fazer nunca mais aprenderia (o mais certo é terem tido oportunidades e não as terem aproveitado), por outro estimularíamos algo que no nosso curso (e até noutros), dada a especificidade do mesmo, se preza muito - a capacidade de síntese. Quem está, como eu, habituado a escrever muito, teria é que, por ventura, ter uma tarefa suplementar: a de mondar texto para o adaptar ao acordado.
Dada a explicitação do tema, deixo a proposta à consideração dos meus futuros professores. Que tal se me deixassem fazer trabalhos individuais no penúltimo dos meus seis semestres (o último será em estágio, ou seja, em grupo) em Ciências da Comunicação? Mesmo que nenhum dos meus colegas se reveja naquilo que escrevi, considerem pelo menos que, algures no leque dos alunos universitários que compõem a vossa universidade, existe um que está convencido que consegue levar o primeiro semestre de 2013/2014 a carpir as suas teses. A meu favor está a respetiva salvaguarda: a cláusula fantástica que diz que se correr mal só me prejudico a mim.
Nota final: Deixo bem claro no texto - e espero que todos o entendam desta forma - que a minha posição se deve a uma problematização dos trabalhos de grupo dentro do ensino universitário (tendo sempre em consideração que, durante pelo menos 12 anos, todos realizámos trabalhos de grupo) e não a qualquer quezília derivada da realização dos mesmos. Até ver, sempre fiz trabalhos de grupo com o mesmo interesse, afinco e motivação com que abordo os meus trabalhos individuais. A colocar-se uma hipótese, a que seria sensata e de acordo com a realidade seria a de que quem trabalha comigo é bem sucedido. E não é apenas o "Perspetivas" que o comprova, porque em abono da verdade, são mais de doze anos de trabalhos levados a cabo com múltiplas pessoas com as mais diversas personalidades.
André Santos, nº 45796